Ferreira Gullar disse que não escreve mais poesia
O autor de
"Poema sujo" e "Traduzir-se", que Fagner transformou numa
linda canção, já foi "vítima" de um post
desta cronista. Eu adorei quando ele
reclamou do péssimo funcionamento de uma agência do Itaú e Gullar fez essa
reclamação numa coluna da Folha de S.Paulo.
É que a gente se esquece que os poetas tem conta bancária...
A declaração de que
ele não escreve mais poesia está na entrevista publicada na revista Isto É, de
24 de julho de 2013. Confesso que eu gostaria de estar na pele da repórter
Eliane Lobato e tê-lo entrevistado. Mas aí, eu pediria ao editor-chefe para
estender numa outra edição...
Repórter Eliane
Eliane Lobato: O sr. tem feito poesia?
Ferreira
Gullar: Depois do último livro que
publiquei, em 2010, nunca mais escrevi poesia.
Repórter: Por quê?
Gullar: Não sei. Poesia não se decide escrever. Eu
não vou escrever só porque faz tempo que eu não escrevo. Poesia é movida por
espanto, alguma coisa que você não controla. Inesperadamente. Meu filho está comendo tangerina, eu sinto o cheiro que
já senti mil vezes, mas naquele momento foi uma coisa especial. O cheiro, a
cor... e assim nasce o poema. Mas eu não provoquei nada. Mas se isso não
acontece mais, se não me surpreendo mais com as coisas, não vu escrever mais.
Porque não vou escrever besteira só para dizer que estou escrevendo.
Repórter: Nada mais
o espanta?
Gullar:
Nada. Estou com 82 anos e nada mais me espanta. Me ocupo fazendo colagens,
pintando, coisas que faço como hobby, já que não me considero artista plástico.
Faço para ocupar meu tempo, e com prazer.
"Traduzir-se"
é uma das pérolas de Gullar, transcrito para você do fundo do meu coração:
Uma
parte de mim
é
todo mundo
outra
parte é ninguém
fundo
sem fundo.
Uma
parte de mim
é
multidão
outra
parte estranheza
e
solidão.
Uma
parte de mim
pesa,
pondera
outra
parte
delira.
Uma
parte de mim
almoça
e janta
outra
parte se espanta.
Uma
parte de mim
é
permanente
outra
parte
se
sabe de repente.
Uma
parte de mim
é
só vertigem
outra
parte,
linguagem.
Traduzir
uma parte
na
outra parte
-
que é uma questão
de
vida ou morte -
será
arte?
Quer ouvir a música?
Fagner ao vivo, com o Quarteto Iguaçu: http://www.youtube.com/watch?v=8-WOy1i8ipU
A versão clássica http://www.youtube.com/watch?v=9rYwWUlXRiI