Tem que ser Clarice! É um chamado! Preciso atender!
Os dois saltimbancos. Pablo Picasso. Paris, 1901 |
Em algum ponto deve estar havendo um erro: é que ao
escrever, por mais que me expresse, tenho a sensação de nunca na verdade ter-me
expressado. A tal ponto isso me desola que me parece, agora, ter passado a me
concentrar mais em querer me expressar do que na expressão ela mesma. Sei que é
uma mania muito passageira. Mas, de qualquer forma, tentarei o seguinte: uma
espécie de silêncio. Mesmo continuando a escrever, usarei o silêncio. E, se
houver o que se chama de expressão, que se exale do que sou. Não vai mais ser: “Eu
me exprimo, logo sou.” Será: “Eu sou; logo sou.”
| Clarice Lispector. A descoberta do mundo, p. 270
| Arte: Os dois saltimbancos, Picasso, Paris, 1901