A vida, esse banquete





“A mesa fora coberta por uma solene abundância. Sobre a tolha branca amontoavam-se espigas de trigo. E maças vermelhas, enormes cenouras amarelas, redondos tomates de pele quase estalando, chuchus de um verde líquido, abacaxis malignos na sua selvageria, laranjas alaranjadas e calmas, maxixes eriçados como porcos-espinhos, pepinos que se fechavam duros sobre a própria carne aquosa, pimentões ocos e avermelhados que ardiam nos olhos – tudo emaranhado em barbas e barbas úmidas de milho, ruivas como junto de uma boca. E os bagos de uva. As mais roxas das uvas pretas e que mal podiam esperar pelo instante em que seriam esmagadas. E não lhes importava esmagadas por quem. Os tomates eram redondos para ninguém: para o ar, para o redondo ar. Sábado era de quem viesse.”


= Clarice Lispector. Felicidade Clandestina. A repartição dos pães, p. 98. Francisco Alves editora, 1994, 8ª edição.

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